Os sentimentos apaixonados que nos ligam a alguém não são
criados por palavras. Os desentendimentos que aos poucos ou de súbito nos
separam da pessoa não são provocados por palavras. Os sentimentos de perda, dor
e morte causados pelas rupturas tampouco são remediados por palavras. As
palavras descrevem, celebram, exaltam e lamentam nossas paixões, mas não são
responsáveis por elas. Quando se trata de amor, as palavras são inúteis.
Não obstante, nós falamos. Cultivamos a ilusão de que o
outro pode ser envolvido, seduzido, convencido pela nossa retórica.
Acreditamos, fundamentalmente, que o nosso desejo pode ser transmitido pela
palavra. Por isso, telefonamos, mandamos mensagens, escrevemos longos emails,
rabiscamos poemas, fazemos letras de música, marcamos conversas dolorosas e
intermináveis que – a rigor – não levam a lugar nenhum.
Quando existe um sentimento comum, as palavras são apenas
acessórias. Quando não há sentimento, elas agem como um bisturi: cortam, expõem
e dilaceram, mas não criam.
.......
As palavras são apenas sintomas.
Quando as pessoas se conhecem e se apaixonam, conversam da mesma forma como se
beijam, com fúria e com encantamento. No final, quando tudo acabou, as palavras
doem e escasseiam. Elas são repelidas pelo outro da mesma forma que o toque,
igual que o olhar. Temos a impressão de estar encerrando o amor com as
palavras, mas elas são apenas as flores do enterro. Quando chegamos a elas, o
desejo está morto.
Infelizmente, os ciclos de paixão e rejeição não são
simultâneos. Eu ainda estou cheio de palavras doces, mas você não quer mais
ouvi-las. Ou eu me dirijo a você com palavras de desejo e prazer, mas elas
deixaram de fazer sentido. Se você não sente mais o que eu sinto, não vai
entender o que eu digo. Nem será tocada pela magia das minhas palavras, que se
tornam inúteis. Quantas das nossas conversas não são trocas de palavras
inúteis? Tentamos transpor com elas o abismo da indiferença do outro.
Explicamos, sugerimos, argumentamos - inutilmente.
Então, economize palavras. Fique quieto e preste atenção.
Escute o que ela não diz. Entenda o que ele nem falou.
Os gestos contam coisas,
os olhares antecipam.
Atitudes valem mais do que declarações de amor – e não
podem ser substituídas ou consertadas por palavras.
(Ivan Martins – editor da Época)
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