sábado, 27 de abril de 2013

Cada macaco no seu galho

É muito estranha essa tara que o ser humano tem pelo julgamento. Mesmo sem querer, num piscar de olhos, estamos julgando o parente distante, o amigo de infância, o colega de pilates ou a vizinha do apartamento ao lado. E aqueles que levantam a bandeira do julgar-é-feio, inevitavelmente, já julgaram uma pessoa ou outra.

O que acontece conosco? Por que é tão fácil e simples falar do umbigo do outro ao invés de olhar para o nosso? Sem papas na língua, ajeitamos a vida de quem atravessa nosso caminho. Resolvemos problemas, oferecemos soluções Miojo. Em três minutos tudo fica resolvido. Em meia dúzia de segundos dizemos que o problema do casamento da Fulana é que ela não dá a atenção que o marido precisa, que o filho da Beltrana é mimado porque assim que ele chora ela pega no colo.

As pessoas esquecem que cada um tem uma cabeça, uma vivência, um motivo, um padrão de funcionamento. Na verdade, as pessoas esquecem de olhar para o seu rabo. É muito mais fácil ficar sentadinho tomando uma Coca zero e debatendo sobre os quilos extra que dona Maria ganhou nos últimos meses. Difícil mesmo é se despir e se encarar de frente. Se eu falo tanto do outro é porque algo dentro de mim está desarrumado, desajustado, desorganizado. Se eu quero tanto resolver o problema alheio é porque não faço questão de pensar no meu, é porque insisto em tapar o sol com a peneira, é porque olhar para a nossa sombra é um processo doloroso.

Minha vida, segundo o que ouvi hoje, é perfeita. Tenho um apartamento bonito, um homem que me ama, uma cachorrinha amorosa, um trabalho que me dá prazer. O que mais eu quero? É tudo tão bom, tudo tão bacana, tudo tão legal. Não tenho direito de ficar triste nem de reclamar, tenho tudinho ao meu dispor. Tsc, tsc. Já cometi o erro de dizer que determinada pessoa não tinha motivo para queixas. Esqueci que não tenho superpoderes nem o dom de ver alguém por dentro. Não sei das cicatrizes, das feridas que não fecham, do que foi dito e ficou tatuado, da pedra que incomoda o sapato a cada passo. Não sei das noites em claro, do motivo das olheiras, da saudade da infância, da falta do gosto, da palavra que não foi falada, do sentimento que não foi revelado, da vergonha guardada no canto da boca. Eu não sei o que o outro traz a tiracolo. Então, me esforço e me calo. Guardo para mim os pensamentos. Antes eu era uma inconsequente. Julgava a torto e a direito. Até que a maturidade resolveu me puxar a orelha. Ei, para com isso. Para de pensar que pode tudo, afinal, você não é nada. Ei, sossega, cuida da sua vida. Então parei. Parei e resolvi cuidar do meu umbigo. Das minhas falhas, acertos, tropeços e anseios. Deixa que do outro ele mesmo cuida.

Não tenho nem o direito de invadir espaços que não são meus. Não sou uma divindade, tampouco juíza. Por isso, me recolho. Sou um grão de areia no meio dessa imensidão toda. E não admito que alguém dê palpite na minha vida, que nada tem de perfeita. Tenho reticências que vivem pegando no meu pé, alguns parágrafos incompletos, frases que começam sem nexo, textos que não se desenvolvem, ideias que mudam de lugar, pontos finais e sílabas que não se casam. Tenho lá minhas melancolias, minhas músicas bregas, meus choros inexplicáveis, meu humor que anda de gangorra, meus momentos de surto e solidão. Porque sou humana. E isso explica tudo.

Clarissa Corrêa


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