quarta-feira, 23 de julho de 2014

Racista, machista e homofóbico jamais. Mas gordofóbico tudo bem?


Agradeço todos os dias por viver num meio no qual convivo com pessoas que, em sua grande maioria, não emitem nem toleram comentários racistas, homofóbicos, machistas ou discriminatórios em geral, nas suas mais diversas e infelizes formas.

Felizmente, vivemos numa sociedade que suporta cada vez menos a ignorância e a pobreza de espírito.

No entanto, me canso de ver essas mesmas pessoas, supostamente tão sensatas, dizendo, sem qualquer pudor, culpa ou constrangimento algo desnecessário e agressivo sobre “aquele gordo” ou “uma gorda aí”.

Me parece haver uma espécie de “zona franca” na qual as pessoas resolveram que falar de forma discriminatória de gente que está acima do peso ideal, teoricamente não tem problema, não é discriminação, não é errado.

Frequentemente, a justificativa é que “hoje em dia, só é gordo quem quer”. Mentira. Todos sabemos o quão mentiroso isso é. Se fosse assim, com certeza não veríamos o Ministério da Saúde divulgar que quase 50% da população brasileira está acima do peso.

Obviamente, não estou afirmando que o sobrepeso e a obesidade devam ser encarados como fatos imutáveis ou que não haja necessidade de combatê-los. Claro que não. Questões de saúde devem ser prioridade para qualquer pessoa. O que estou falando é que o excesso de peso alheio não dá a ninguém a prerrogativa de julgá-lo. Só isso.

A pessoa que está acima do peso com frequência é vista como preguiçosa, descuidada, como alguém que poderia estar magro e esbelto e optou por não estar. Interessante que muitas das pessoas que falam “daquele gordo” estão entre aquelas que há anos afirmam que vão perder 2 quilinhos para o verão e nunca o fazem. “Mas na hora que eu quiser eu perco”. Bullshit. Você quer perder e não perde.

Fazer dieta nunca é fácil. Renunciar à cervejinha, ao chocolatinho, ao pãozinho francês, à carne vermelha é duro. Correr na esteira também. Mas mais difícil do que isso é lutar contra um metabolismo lento, uma tireóide desobediente, uma genética desfavorável, um pós-gravidez cruel, uma menopausa avassaladora. E ainda pior é ter que conviver com os olhares tortos, as risadas por detrás das mãos, os comentários que se finge não perceber por instinto de sobrevivência.

E se a pessoa que está acima do peso for mulher, pior ainda. Com a persistente ideia de mulher objeto, uma mulher gorda é vista como sinônimo de inutilidade. Afinal, “para que serve uma mulher gorda?”. Só para zoar na balada com seus “bróder”, né? Credo.

Constata-se o óbvio: gordura não é escolha. E alguns lutam mais contra isso, outros menos.

E daí? O que você tem a ver com isso?

Alguém te julga porque você ainda não foi consultar um psicólogo para cuidar dos seus traumas de infância? Ou porque ainda não foi no dermatologista ver aquela pinta que pode ser câncer de pele? Será que você não tem problemas até mais graves do que muita “gente gorda”, mas que apenas não são tão evidentes?

Será que não tem muita “gente gorda” mais saudável e bem resolvida do que você? Será que não tem gente acima do peso com uma auto estima bem maior do que a sua? Mais seguro, mais bem disposto, mais feliz?

O fato é, com que direito as pessoas decidiram condenar os quilos alheios? E, pior, por que elas resolveram achar que chamar alguém de gordo, com ar pejorativo ou hostil não é algo grave? Não é tão asqueroso quanto discriminação por cor, orientação sexual ou gênero?

Pois é. O peso alheio não te diz respeito. O que diz respeito a todos nós é aquela ideia antiga, antiquada, talvez um pouco demodée, de respeitar os outros, ainda que sem patente alta ou bigode grosso. Se não por vontade ou generosidade, talvez por decência. Será que soa tão estranho assim?

RUTH MANUS

Do http://blogs.estadao.com.br/

Há sempre alguém que precisa de ti



O MUNDO INTEIRO está cheio de pessoas.

Há pessoas caladas que precisam de alguém para conversar.

Há pessoas tristes que precisam de alguém para confortá-las.

Há pessoas tímidas que precisam de alguém para ajudá-las a vencer a timidez.

Há pessoas sozinhas que precisam de alguém para brincar.

Há pessoas com medo, que precisam de alguém para lhes dar a mão.

Há pessoas fortes que precisam de alguém para fazê-las
pensar na melhor maneira de usarem a sua força.

Há pessoas habilidosas que precisam de alguém para ajudá-las a descobrir a melhor maneira de usarem sua habilidade.

Há pessoas apressadas que precisam de alguém para lhes
mostrar tudo o que não têm tempo para ver.

Há pessoas impulsivas que precisam de alguém para ajudá-las a não magoarem os outros.

Há pessoas que se sentem de fora e precisam de alguém
para lhes mostrar o caminho de entrada.

Há pessoas que dizem que não servem para nada e precisam de alguém para as ajudar a descobrir como são importantes. PRECISAM DE ALGUÉM, TALVEZ DE TI...

Felipe Aquino

sábado, 12 de julho de 2014

As palavras mais doídas são as não ditas


A Copa do Mundo foi um anúncio de vergonha desde o dia em que ficou decidido que seria realizada no Brasil. O vexame de 7 a 1 foi a conclusão de um processo equivocado. E foi triste. Mesmo quem, como eu, não concordava com essa Copa dessa forma, sentiu pesar pela derrota, e muitas, muitas pessoas proferiram sua revolta e raiva aos quatro cantos do estádio, das ruas, das redes sociais.
Uma infinidade de palavras e palavrões. Disseram o que queriam dizer. E será que dizer o pior é o pior que pode haver?

***

João queria pedir desculpas. Teresa queria declarar o seu amor. Luíza, desaguar os anos de mágoa. Pedro queria pedir um abraço. Joana, perdão. Lúcio queria apenas licença para ser quem era. Paulo, aprovação. Camila, explicação. Helena queria dizer que não faria de novo. Não, outra vez não. Fabrício queria um sorriso. Ana, devolução. José queria dizer obrigado. Marília só queria que soubesse que havia perdoado. Foi, deu, ficou pra trás. Cecília queria dizer não. Augusto, sim. Frederico queria dizer adeus.

Mas João não disse. Nem Teresa. Nem Luíza. Pedro. Joana. Ou Paulo. Camila. Helena. Não disse o Fabrício. Nem a Ana. O José. Marília ou Cecília. O Augusto não disse. Frederico também não.

Não disseram porque tiveram medo. Por causa da distância. Não disseram porque faltaram as palavras. Faltou a oportunidade, a força de vontade. 
Não disseram porque emudeceram, porque as línguas eram diferentes como diferentes eram os sinais. 
Não disseram porque não valeria à pena. 
Não faria a diferença. 
Porque não conseguiram. 
Porque deixaram para depois, e o depois nunca chegou.

São infinitas as razões e não razões pelas quais deixamos de dizer algo que precisávamos ter dito, gostaríamos de ter dito. Não apenas por falar. Para desatar nós e seguir adiante. 

É que o silêncio, às vezes, é menos assustador que a palavra. 
No silêncio, somos rei e senhor. Nosso domínio é soberano, porque só a nós diz respeito. 
Quebrar o silêncio é arcar com as consequências. É enfrentar. 

O silêncio não traz enfrentamento, e os riscos são poucos. Mas as alegrias também. 
Quantas pessoas passam a vida sem ter dito o que realmente queriam? 
Sem ter feito as pazes ou ter rompido o que deveria ser rompido? 
Sem dar sequência ou terminar o que deveria ser terminado? 
Um ponto final ou um ponto de partida. 
Não. As palavras não ditas são reticências.

A palavra não dita consome e esmaga. 
Dependendo daquilo que se quer dizer, o não dizer é um discurso calado, solitário e ininterrupto. É um nó que não desata. 
Um conjunto de letras e sílabas com o peso de todas as letras, todas as sílabas e todas as combinações possíveis do todos os alfabetos, porque é aquilo que não teve um fim. Ficou por ser. 

A palavra não dita é a palavra que, presa, aprisiona. Entristece. 
Não são as palavras feias as mais doídas. 
As mais doídas são as palavras não ditas.

Se você tem algo por dizer, diga. Não deixe para depois, porque o depois pode não chegar.

Do Blog Estadão

Portas


Se você abre uma porta, você pode ou não entrar em uma nova sala. Você pode não entrar e ficar observando a vida. Mas se você vence a dúvida, o temor, e entra, dá um grande passo: nesta sala vive-se ! Mas, também, tem um preço... 

São inúmeras outras portas que você descobre. Às vezes curte-se mil e uma. 
O grande segredo é saber quando e qual porta deve ser aberta. 

A vida não é rigorosa, ela propicia erros e acertos. 
Os erros podem ser transformados em acertos quando com eles se aprende. Não existe a segurança do acerto eterno. 

A vida é generosa, a cada sala que se vive, descobre-se tantas outras portas. E a vida enriquece quem se arrisca a abrir novas portas. Ela privilegia quem descobre seus segredos e generosamente oferece afortunadas portas. 

Mas a vida também pode ser dura e severa. Se você não ultrapassar a porta, terá sempre a mesma porta pela frente. É a repetição perante a criação, é a monotonia monocromática perante a multiplicidade das cores, é a estagnação da vida... 

Para a vida, as portas não são obstáculos, mas diferentes passagens!

Içami Tiba

terça-feira, 8 de julho de 2014

Permanecer vivo até o último momento


Muitas pessoas já deixaram de viver, embora continuem trabalhando, comendo, e tendo suas atividades sociais de sempre. Fazem tudo de maneira automática, sem compreender o momento mágico que cada dia traz em si, sem parar para pensar no milagre da vida, sem entender que o próximo minuto pode ser o seu último momento na face deste planeta.

Um dia, apesar de todo o avanço da ciência, deixaremos este mundo, e teremos um funeral. 

Recordando trechos de uma poema antigo:

Quando a indesejada das gentes chegar

Talvez eu tenha medo. Talvez eu sorria e diga:

O meu dia foi bom, a noite pode descer.

Encontrará lavrado o campo, a mesa posta, a casa limpa, cada coisa em seu lugar.

Assim, se tivermos que morrer hoje, apesar de tudo o que tenha ocorrido em nossas vidas, apesar das derrotas, das injustiças que sofremos ou que fizermos alguém sofrer, temos que permanecer vivos até o último minuto, e certamente afirmar: “o meu dia foi bom, a noite pode descer.”

por Paulo Coelho

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Xô, Rainha Vermelha!

“Nós nos tornamos máquinas de trabalhar e estamos transformando nossas crianças em máquinas de aprender”. Augusto Cury, médico psiquiatra e escritor



Vocês se lembram da história Alice no país das maravilhas?

Hão de estar lembrados da rainha vermelha. Foi ela que tomou Alice pela mão e a arrastou a toda velocidade pelo mundo encantado do fundo do espelho, gritando: “Depressa! Depressa! Não tente falar! Depressa!” Era um excelente personagem imaginário e muito divertido para crianças que há anos leram a história.

Sou capaz de apostar que as crianças de hoje não a consideram tão engraçada nem tão imaginária. É que a rainha vermelha saiu das páginas de ficção e transmitiu seus hábitos a pais e mães em toda parte. Se conseguirmos parar um instante para refletir, veremos que a tendência em relação aos nossos filhos é a de torná-los adultos o mais rápido possível. Ou ainda: transformá-los em máquinas de aprender.

Hoje em dia os pais pensam que depois da escola é preciso haver um complemento enriquecedor sob a forma de aulas de inglês, natação, balé, academia, aulas particulares, caratê, religião...

Curioso também é notar que paralelamente a esses procedimentos cresce o número de psicólogos que estão atendendo crianças em seus consultórios. A criança já está indo para o divã da terapia em lugar de passar tardes sob uma mangueira ouvindo bem-te-vis e imaginando figuras nos contornos das nuvens.

“Isto é coisa do passado!”, diria o leitor, “não leva a nada no futuro”, completaria ele. Mas as gerações nascidas nos anos 50 e 60 já provaram que uma infância mais próxima do parcimonioso ócio junto à natureza conseguiu levar homens a cargos de alta relevância nas empresas, nas indústrias, na política, na economia, nas artes, na cultura em geral. A pressa e o acúmulo de atividades não são sinônimos de formação precoce para o sucesso. Triste ainda é ver que os olhos de tantas crianças bem nutridas estão fixos não na natureza, não nos livros, mas na tela hipnotizadora da Internet, sob quaisquer aparelhos, do simples computador ao WhatsApp.

A verdade é que as crianças não são mais chamadas “crianças”. São todas “pré” alguma coisa. Mal o bebê sai do seu cercadinho, está em idade pré-escolar; quando chega à idade escolar, nós o agarramos pelo braço e o consideramos pré-adolescente. Quando chega à adolescência, tendo de enfrentar os problemas complexos dessa época, continuamos a impedir que ele siga o ritmo natural da vida e dizemos que ele já é um jovem adulto.

“Estamos quase chegando”, conseguiu Alice arquejar finalmente. “Quase chegando?”, repetiu a rainha vermelha, “Ora, já passamos por lá há 10 minutos. Depressa, depressa, vamos mais rápido!”

Parece ser comum os pais dizerem algo parecido a “Se você não conseguir notas melhores, nunca chegará à faculdade. E se não entrar para a faculdade, nunca chegará a ter um emprego bem remunerado!” E lá vai o menino com a pressão do mundo adulto sobre os ombros: “Depressa! Depressa! Você tem de vencer. Seja esperto! Não se deixe ficar para trás. Corra! Corra! Depressa!”

Não condeno em hipótese alguma pais nortearem a vida de seus filhos pela responsabilidade para com suas funções escolares, a cortesia, a educação social, o respeito às instituições... Ressalto de forma convicta que o acúmulo de atividades (muito além da capacidade natural de absorção da criança) mais a exigência do compromisso com o êxito, com margem mínima de erro, não pode ser considerado formação ideal e saudável. Nem eficaz: basta exemplificar com o número assustador de jovens japoneses que se suicidam por não serem aprovados nos exames introdutórios aos cursos superiores. É muita pressão.

Já é tempo de examinarmos os nossos próprios atos em relação às crianças e adolescentes. Penso nos filhos: é preciso abraçá-los, protegê-los, acolhê-los, tirá-los o quanto antes das mãos da rainha vermelha. Se uma língua estrangeira é vital na época de hoje, que ela seja estudada de forma pontual e sensata, mas nunca concomitantemente com dez ou doze outras tarefas, de modo a não permitir à criança, ao adolescente, ao jovem o contato consigo mesmo e com a própria vida.

Comecemos a insistir para que as crianças sejam crianças e façamos a rainha vermelha voltar ao livro de histórias, de onde ela nunca deveria ter saído.

PS: meu prezado leitor - confesso que o título deste artigo encimava um texto de teor político; a rainha vermelha representava nossa presidente, cujo partido se tinge da mesma cor. Havia coerência entre a pressa na história de ficção e a pressa em entupir, por um exemplo, salas de aula de cursos superiores com alunos bolsistas, sem o mérito da capacidade e o desprezo pela excelência no ensino e na pesquisa. Optei pela criança, pois é mais fácil endireitar o broto que o galho velho, retorcido.

Do Jornal Comércio da Franca
Everton de Paula, acadêmico e editor