sábado, 26 de setembro de 2015

Saudade é o amor que fica


Como médico cancerologista, já calejado com longos 29 anos de atuação profissional (...) posso afirmar que cresci e modifiquei-me com os dramas vivenciados pelos meus pacientes. Não conhecemos nossa verdadeira dimensão até que, pegos pela adversidade, descobrimos que somos capazes de ir muito mais além.

Recordo-me com emoção do Hospital do Câncer de Pernambuco, onde dei meus primeiros passos como profissional... Comecei a freqüentar a enfermaria infantil e apaixonei-me pela oncopediatria. Vivenciei os dramas dos meus pacientes, crianças vítimas inocentes do câncer. Com o nascimento da minha primeira filha, comecei a me acovardar ao ver o sofrimento das crianças.

Até o dia em que um anjo passou por mim! Meu anjo veio na forma de uma criança já com 11 anos, calejada por dois longos anos de tratamentos diversos, manipulações, injeções e todos os desconfortos trazidos pelos programas de químicos e radioterapias. Mas nunca vi o pequeno anjo fraquejar. Vi-a chorar muitas vezes; também vi medo em seus olhinhos; porém, isso é humano!

Um dia, cheguei ao hospital cedinho e encontrei meu anjo sozinho no quarto. Perguntei pela mãe. A resposta que recebi, ainda hoje, não consigo contar sem vivenciar profunda emoção.

— Tio, — disse-me ela — às vezes minha mãe sai do quarto para chorar escondido nos corredores... Quando eu morrer, acho que ela vai ficar com muita saudade. Mas, eu não tenho medo de morrer, tio. Eu não nasci para esta vida!

Indaguei:

— E o que morte representa para você, minha querida?
— Olha tio, quando a gente é pequena, às vezes, vamos dormir na cama do nosso pai e, no outro dia, acordamos em nossa própria cama, não é? (Lembrei das minhas filhas, na época crianças de 6 e 2 anos, com elas, eu procedia exatamente assim.)
— É isso mesmo.
— Um dia eu vou dormir e o meu Pai vem me buscar. Vou acordar na casa Dele, na minha vida verdadeira!

Fiquei "entupigaitado", não sabia o que dizer. Chocado com a maturidade com que o sofrimento acelerou, a visão e a espiritualidade daquela criança.
— E minha mãe vai ficar com saudades — emendou ela.

Emocionado, contendo uma lágrima e um soluço, perguntei:
— E o que saudade significa para você, minha querida?
— Saudade é o amor que fica!

Hoje, aos 53 anos de idade, desafio qualquer um a dar uma definição melhor, mais direta e simples para a palavra saudade: é o amor que fica!

Meu anjinho já se foi, há longos anos. Mas, deixou-me uma grande lição que ajudou a melhorar a minha vida, a tentar ser mais humano e carinhoso com meus doentes, a repensar meus valores. Quando a noite chega, se o céu está limpo e vejo uma estrela, chamo pelo "meu anjo", que brilha e resplandece no céu.

Imagino ser ela uma fulgurante estrela em sua nova e eterna casa. Obrigado anjinho, pela vida bonita que teve, pelas lições que me ensinaste, pela ajuda que me deste. Que bom que existe saudade! O amor que ficou é eterno.

Artigo do Dr. Rogério Brandão, Médico oncologista

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Reflexão (do Coração do Papa Francisco)



Não existe família perfeita. 

Não temos pais perfeitos ,não somos perfeitos, não nos casamos com uma pessoa perfeita nem temos filhos perfeitos. 
Temos queixas uns dos outros. Decepcionamos uns aos outros. 

Por isso, não há casamento saudável nem família saudável sem o exercício do perdão. 
O perdão é vital para nossa saúde emocional e sobrevivência espiritual. 

Sem perdão a família se torna uma arena de conflitos e um reduto de mágoas. 
Sem perdão a família adoece. 
O perdão é a assepsia da alma, a faxina da mente e a alforria do coração. 
Quem não perdoa não tem paz na alma nem comunhão com Deus. 

A mágoa é um veneno que intoxica e mata. Guardar mágoa no coração é um gesto autodestrutivo. É autofagia. 

Quem não perdoa adoece física , emocional e espiritualmente. 

É por isso que a família precisa ser lugar de vida e não de morte; território de cura e não de adoecimento; palco de perdão e não de culpa. 

O perdão traz alegria onde a mágoa produziu tristeza; cura, onde a mágoa causou doença. 

(do Coração do Papa Francisco)

domingo, 20 de setembro de 2015

Saber medir as nossas palavras



Estávamos os três a tomar uma cerveja. A esplanada, quase vazia. Depois de um dia extenuante de trabalho, logicamente, o cansaço fazia-se notar. De repente, um deles fez ao outro uma pergunta indelicada, com uma certa ironia e até violência. Mais do que perguntar, parecia que estava a brincar com uma atitude que não entendia. Instintivamente, fiquei à espera de uma resposta à altura das circunstâncias. Mas ela não veio. Pelo contrário, a contestação foi cordial e sem azedume.


Fez-me pensar. Aquela pessoa levava consigo o seu próprio ambiente. Um ambiente que não dependia de circunstâncias nem de provocações. Podendo fazê-lo, por uma questão de “estrita justiça”, não tinha devolvido o mal com o mal. Demonstrava com isto um senhorio de si próprio fora do comum. Ao outro só restavam duas opções: pedir desculpas pelo modo como tinha abordado o assunto ou fingir que nada tinha acontecido. Escolheu esta última por ser a mais cómoda, e, pensava ele erradamente, a menos humilhante. Que diferença tão grande de nível humano em duas pessoas com a mesma profissão.


O meu amigo cordial tinha um tom humano impressionante. Um tom que facilitava o relacionamento mútuo, que fazia com que os outros se sentissem bem ao seu lado. Sabia estar com todos. Irradiava à sua volta um ambiente agradável, de profunda dignidade. Oferecia uma amizade sincera, sem ocultar a sua identidade de cristão coerente por medo a ser rejeitado. E foi devido a essa sua coerência que a pergunta irónica tinha surgido. Ao fazer-lhe ver a minha admiração pelo modo como tinha actuado, respondeu-me: “não há caridade sem respeito, e não há respeito se não sabemos medir as nossas palavras”.


Saber medir as nossas palavras. Quantas vezes ferimos os outros porque não sabemos medir as nossas palavras. E isso não é hipocrisia nem falta de sinceridade. É simplesmente respeito. É capacidade de nos pormos na situação dos outros e descobrir que não gostaríamos que nos falassem assim. Dizer o que pensamos sem pensar no que dizemos, geralmente, é uma atitude bastante irresponsável. É como atirar uma pedra pela janela sem preocuparmo-nos com os estragos que possa provocar.


Cuidar o modo como dizemos as coisas também não é algo superficial. Quantas vezes, tendo alguma razão, a perdemos não por aquilo que dizemos, mas pelo modo como o fazemos. Quase tudo depende da forma de dizer as coisas. Há muitos modos de dizer a mesma coisa e, habitualmente, não é necessário tornar a verdade antipática a ninguém. A verdade é como uma flor. Não é a mesma coisa oferecê-la a alguém ou atirá-la à sua cara. A segunda atitude não é mais sincera, ainda que muitas pessoas nos tentem convencer do contrário.


Pe. Rodrigo Lynce de Faria

O vaso de porcelana e a rosa


O grande mestre e o guardião dividiam a administração de um mosteiro zen. Certo dia, o guardião morreu e foi preciso substituí-lo.

O grande mestre reuniu todos os discípulos para escolher quem teria a honra de trabalhar diretamente ao seu lado.

“Vou apresentar um problema”, disse o grande mestre. “E aquele que o resolver primeiro, será o novo guardião do templo”.

Terminado o seu curtíssimo discurso, colocou um banquinho no centro da sala. Em cima estava um vaso de porcelana caríssimo, com uma rosa vermelha a enfeitá-lo. “Eis o problema”, disse o grande mestre.

Os discípulos contemplavam, perplexos, o que viam: os desenhos sofisticados e raros da porcelana, a frescura e a elegância da flor. O que representava aquilo? O que fazer? Qual seria o enigma?

Depois de alguns minutos, um dos discípulos levantou-se, olhou o mestre e os alunos a sua volta. Depois, caminhou resolutamente até o vaso, e atirou-o no chão, destruíndo-o.

“Você é o novo guardião”, disse o grande mestre para o aluno.

Assim que ele voltou ao seu lugar, explicou: “eu fui bem claro: disse que vocês estavam diante de um problema. Não importa quão belo e fascinante seja, um problema tem que ser eliminado. Um problema é um problema; pode ser um vaso de porcelana muito raro, um lindo amor que já não faz mais sentido, um caminho que precisa ser abandonado, mas que insistimos em percorrê-lo porque nos traz conforto. Só existe uma maneira de lidar com um problema: atacando-o de frente. 

Nessas horas, não se pode ter piedade, nem ser tentado pelo lado fascinante que qualquer conflito carrega consigo”.

Paulo Coelho

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

A voz da avó

E nada mais.



Entrei no pequeno apartamento, gostava dele. Apanhava bastante luz do sol, tinha uma vista incrível da basílica, especialmente ao entardecer.

Aos poucos, fui tornando-o meu. Porta-retratos carregados de amores, sapatos espalhados, livros abertos no chão, temperinhos na cozinha. Depois de uma semana, já era a minha casa.

Noite fria, sentei-me em frente ao computador, santo Skype, tocou, tocou e ela atendeu. No primeiro “alô”, senti como se sua voz, tão doce quanto esganiçada, começasse a se espalhar pelo piso e subisse lentamente pelas paredes, como uma tinta coral aveludada, impregnando cada um daqueles poucos metros quadrados com sua presença, que mais se parecia com um abraço quente.

Não importava o quanto eu gastasse com a decoração. Foi a voz dela que finalmente transformou aquela casa num lar.

A voz da avó. Coisa poderosa. Não importa qual é o timbre, se é estridente, rouca ou tremida. Não importa se é mansa ou gritada. Não importa se é ou não capaz de entoar canções de ninar.

A voz da avó pode dizer tudo o que quiser sem que soe como exigência, afronta ou desaforo. A voz da avó tem carta branca e livre trânsito, não nos acua e mesmo quando pergunta o que não deve, não provoca qualquer sentimento de reprovação.

A voz da avó soa sempre como cuidado, como demonstração genuína de afeto, ainda que, às vezes, por vias tortas.

A mesma frase, na voz da mãe e na voz da avó soa completamente diferente.

“Você não comeu?”

Na voz da mãe é cobrança, na voz da avó é oferta. Na voz da mãe é preocupação, na voz da avó é cuidado. Na voz da mãe é ordem, na voz da avó é doce.

“Você está sem casaco?”

Na voz da mãe, vem bronca, na voz da avó, vem lã. Na voz da mãe é gripe, na voz da avó é chocolate quente. Na voz da mãe é “eu canso de falar pra você se agasalhar”, na voz da avó nunca tem cansaço, mesmo com as cordas vocais já tão gastas.

Longe de ser uma acusação às mães. Muito pelo contrário. Mães são o que tem que ser: educação, firmeza, base. Já avós, podem se dar o luxo de ser o que querem ser: delícia, leveza, afago.

Nem sempre elas dirão coisas boas. Às vezes vão dar seus gritos, seus resmungos, suas reclamadas. Porque são humanas. Aliás, são deliciosamente humanas.

Um dia, quando criança, fiz qualquer bobagem e minha avó me chamou de “sua merdinha”. Achei a maior graça. Acabei até gostando. Incrível como até merda, na voz da avó, vira amor. Incrível como só elas podem dizer certas coisas.

Feche os olhos, ouça sua voz.

Faça uma gravação imaginária. Guarde na sua melhor gaveta. Ouça de novo. Garanta que não esquece. Elas não duram para sempre. Mas a voz delas sim. A voz delas marca- e fica. Ouça enquanto pode e guarde naquela sua gaveta. Na melhor gaveta de todas, já que não podemos simplesmente atracá-las ao peito.


Autor: Ruth Manus
http://vida-estilo.estadao.com.br/blogs

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

‘Onde está o mundo?’


Aylan foi o mensageiro e a mensagem jogada ao mar. Devolvido pelas águas à mesma praia na Turquia de onde partira rumo à Europa num bote de esperançados, ele próprio era o recado, que dizia: “Eu sou vocês”. Foi sua imagem sem vida que anunciou ao mundo, em linguagem universal, a falência múltipla de humanidade e civilidade em que vivemos.

À notável exceção da chanceler alemã Angela Merkel, a liderança europeia revelou-se uma muralha de insensatez e déficit moral. Como resposta inicial para a maré humana que bate à porta dos fundos do continente, a Europa ergueu muros. Barricadas de arame farpado surgiram primeiro na fronteira da Hungria com a Sérvia. Outras muralhas em outros países da rota dos refugiados estavam previstas.

É a Europa mostrando suas vísceras. Em vão. Já deveria ter ficado claro para o Ocidente tão orgulhoso de sua civilização cristã que apenas a morte interrompe a marcha de um homem movido a esperança. Segundo dados das Nações Unidas, eles já são 60 milhões — entre refugiados, migrantes, exilados, apátridas compulsórios e enxotados de países do Oriente Médio e África do Norte em guerra ou instáveis.

Basta olhar o mapa desses deslocamentos maciços dos anos recentes. A rota do primeiro grande êxodo foi pelo Mediterrâneo Ocidental, na tentativa de fincar pé na Europa através da Espanha. A impermeabilidade do primeiro-ministro Mariano Rajoy em acolhê-los, contudo, encarregou-se de fazer com que procurassem outros traçados.

A rota migratória seguinte coalhou de embarcações negreiras o Mediterrâneo Central, despejando os sobreviventes na costa da Itália. Atualmente a hégira se deslocou para o Mediterrâneo Oriental, com centenas de milhares de almas despejadas na Grécia para, de lá, tomar o caminho dos Bálcãs e um dia recomeçar a vida, quem sabe, na Alemanha.

O menino Aylan sequer conseguiu sair do ponto de partida. E os que sobreviveram à etapa inicial hoje estão sendo tratados como gado na Hungria, uma das fronteiras de acesso à Europa mais rica. Por isso, uma nova rota já começou a ser testada: esta semana os mercadores de pessoas conseguiram levar sua carga humana até o Nordeste da Rússia, para de lá alcançar a Noruega através do Círculo Ártico.

Tenta-se de tudo para escapar da ratoeira húngara em que se encontra uma massa de desesperados que fugiu da guerra e do terror, da morte ou escravidão e suportou em vão a aliança sanguessuga de policiais, bandidos e traficantes. Com o ultranacionalista Viktor Orbán, chefe do governo da Hungria, decidido a “defender o cristianismo europeu do influxo muçulmano” e a “arrancar a Europa da sua obsessão com imigrantes e refugiados”, o bloqueio de seu país ao trânsito migratório chegou a um ponto de ebulição na noite de sexta-feira.

“Onde está o mundo?”, indagava o cartaz tosco empunhado por um dos refugiados da estação ferroviária de Keleti, impedidos de seguir viagem.

Onde está o Ronald Reagan de hoje para proclamar “Viktor Orbán, derrube este muro?”, como fez em 1987 o presidente americano diante do Portão de Brandemburgo, em desafio ao secretário-geral soviético Mikhail Gorbachev? Hoje, do outro lado do Atlântico, está Donald Trump, que, para conquistar a Casa Branca, promete construir um muro intransponível na fronteira com o México.

Onde está algo próximo ao Kindertransport (transporte de crianças, em alemão), a extraordinária operação humanitária que transportou de Praga até Londres dez mil crianças, em grande maioria judias, às vésperas da Segunda Guerra, salvando-as do holocausto? Na República Tcheca de hoje, policiais retiram refugiados de trens usando a força e ainda lhes atribuem números de registro nos braços ou punhos, a caneta. Felizmente, não foram tatuados, como nos campos de concentração nazistas.

Onde está o similar de corredor humanitário de 1948? Durante o bloqueio soviético de Berlim, uma ponte aérea militar conjunta de ingleses e americanos realizou mais de 200 mil voos para levar comida e suprimentos aos berlinenses em apenas um ano. Hoje, a Inglaterra do conservador David Cameron absorveu apenas 216 do total de quatro milhões de refugiados sírios que fugiram da guerra — número inferior à capacidade de uma única composição do metrô londrino.

Até a imagem do menino Aylan cobrir de opróbrio o planeta Terra, Cameron qualificava os migrantes de “enxame” e seu chanceler Philip Hammond alertava o país contra “saqueadores” africanos que ameaçam o “padrão de vida europeu”. O tabloide conservador “Daily Mail” ecoava: "Mantivemos Hitler fora daqui... Por que nossos líderes não conseguiriam impedir a entrada de alguns milhares de migrantes exauridos?”

A mudança veio da rua, das mídias sociais e conta com a determinação resoluta e decisiva de Angela Merkel. “O seu colega é judeu, seu carro é japonês, sua pizza é italiana, sua democracia é grega, seu café é brasileiro, (...) e você chama seu vizinho de estrangeiro?”, postou uma internauta inglesa inconformada com a indiferença de seus conterrâneos em relação ao outro. Quando o diário de maior circulação da Inglaterra, o eurocético e conservador “The Sun”, mudou de lado e escreveu “Mr. Cameron, acabou o verão... É hora de enfrentar a crise mais grave que a Europa enfrenta desde a Segunda Guerra”, o primeiro-ministro piscou. Cameron está revendo sua política migratória.

Da Islândia, a carta aberta a um ministro, postada por uma escritora de 33 anos, Bryndis Bjorgvinsdottir, levou dez mil compatriotas (4% da população do país) a oferecerem casa, comida, aprendizado da língua e inserção no país a famílias de refugiados. O texto que tanto mexeu com aquela gente de vida isolada, próxima à Groenlândia, dizia:

“Os refugiados são nossos futuros maridos e mulheres, melhores amigos ou almas gêmeas. Eles são os bateristas da banda dos nossos filhos, nosso futuro colega, a Miss Islândia 2022, o carpinteiro que finalmente vai terminar o banheiro, o atendente da cafeteria, o bombeiro, o gênio da informática ou o apresentador de televisão. Pessoas às quais jamais devemos poder dizer no futuro que suas vidas valem menos do que a minha”.

A curta vida do menino Aylan valeu muito: despertou o mundo.

Dorrit Harazim é jornalista
http://oglobo.globo.com/

sábado, 5 de setembro de 2015

No deserto de Mojave


No deserto de Mojave, é frequente encontrarmos as famosas cidades-fantasma: construídas perto de minas de ouro, eram abandonadas quando todo o produto da terra tinha sido extraído. Haviam cumprido seu papel, e não tinham mais sentido.

Quando passeamos por uma floresta, também vemos árvores que, uma vez cumprido seu papel, terminaram caindo.

Mas, diferente das cidades-fantasma, o que aconteceu?

Abriram espaço para que a luz penetrasse, fertilizaram o solo, e seus troncos estão cobertos de vegetação nova.

A nossa velhice vai depender da maneira que vivemos o momento presente. Podemos terminar como uma cidade- fantasma, simplesmente abandonados. Ou então como uma generosa árvore, que continua a ser importante, mesmo depois de caída por terra.

Paulo Coelho - 

Do medo


O guerreiro da luz fica apavorado quando precisa tomar decisões importantes.

“Isto é grande demais para você”, diz um amigo em quem confia. “Vá em frente, tenha coragem”, diz outro amigo em quem confia. E suas dúvidas aumentam.

Depois de alguns dias de angústia, ele recorre ao melhor conselheiro de todos: o escuro do seu quarto.

Nas sombras, ele vê a si mesmo no futuro. Vê as pessoas que serão beneficiadas e prejudicadas por sua atitude. Sabe que, ao dar um passo adiante, deixará alguma coisa - ou alguém - para trás. Ele não quer causar sofrimentos inúteis, mas tampouco quer abandonar o caminho.

O guerreiro que observa a si mesmo deixa que a decisão se manifeste. Se for preciso dizer ‘sim’, ele dirá com coragem. Se for preciso dizer ‘não’, ele dirá sem covardia.

Paulo Coelho - http://g1.globo.com/