sábado, 12 de julho de 2014

As palavras mais doídas são as não ditas


A Copa do Mundo foi um anúncio de vergonha desde o dia em que ficou decidido que seria realizada no Brasil. O vexame de 7 a 1 foi a conclusão de um processo equivocado. E foi triste. Mesmo quem, como eu, não concordava com essa Copa dessa forma, sentiu pesar pela derrota, e muitas, muitas pessoas proferiram sua revolta e raiva aos quatro cantos do estádio, das ruas, das redes sociais.
Uma infinidade de palavras e palavrões. Disseram o que queriam dizer. E será que dizer o pior é o pior que pode haver?

***

João queria pedir desculpas. Teresa queria declarar o seu amor. Luíza, desaguar os anos de mágoa. Pedro queria pedir um abraço. Joana, perdão. Lúcio queria apenas licença para ser quem era. Paulo, aprovação. Camila, explicação. Helena queria dizer que não faria de novo. Não, outra vez não. Fabrício queria um sorriso. Ana, devolução. José queria dizer obrigado. Marília só queria que soubesse que havia perdoado. Foi, deu, ficou pra trás. Cecília queria dizer não. Augusto, sim. Frederico queria dizer adeus.

Mas João não disse. Nem Teresa. Nem Luíza. Pedro. Joana. Ou Paulo. Camila. Helena. Não disse o Fabrício. Nem a Ana. O José. Marília ou Cecília. O Augusto não disse. Frederico também não.

Não disseram porque tiveram medo. Por causa da distância. Não disseram porque faltaram as palavras. Faltou a oportunidade, a força de vontade. 
Não disseram porque emudeceram, porque as línguas eram diferentes como diferentes eram os sinais. 
Não disseram porque não valeria à pena. 
Não faria a diferença. 
Porque não conseguiram. 
Porque deixaram para depois, e o depois nunca chegou.

São infinitas as razões e não razões pelas quais deixamos de dizer algo que precisávamos ter dito, gostaríamos de ter dito. Não apenas por falar. Para desatar nós e seguir adiante. 

É que o silêncio, às vezes, é menos assustador que a palavra. 
No silêncio, somos rei e senhor. Nosso domínio é soberano, porque só a nós diz respeito. 
Quebrar o silêncio é arcar com as consequências. É enfrentar. 

O silêncio não traz enfrentamento, e os riscos são poucos. Mas as alegrias também. 
Quantas pessoas passam a vida sem ter dito o que realmente queriam? 
Sem ter feito as pazes ou ter rompido o que deveria ser rompido? 
Sem dar sequência ou terminar o que deveria ser terminado? 
Um ponto final ou um ponto de partida. 
Não. As palavras não ditas são reticências.

A palavra não dita consome e esmaga. 
Dependendo daquilo que se quer dizer, o não dizer é um discurso calado, solitário e ininterrupto. É um nó que não desata. 
Um conjunto de letras e sílabas com o peso de todas as letras, todas as sílabas e todas as combinações possíveis do todos os alfabetos, porque é aquilo que não teve um fim. Ficou por ser. 

A palavra não dita é a palavra que, presa, aprisiona. Entristece. 
Não são as palavras feias as mais doídas. 
As mais doídas são as palavras não ditas.

Se você tem algo por dizer, diga. Não deixe para depois, porque o depois pode não chegar.

Do Blog Estadão

Nenhum comentário:

Postar um comentário