domingo, 22 de novembro de 2015

A alegria veste a tristeza


Tenho uma predileção por uma frase de Federico Fellini: para a sombra existir, o sol deve estar a pique na cabeça. 
Sem a luz, o escuro não se forma. 
Sem o escuro, a luz não tem sentido. 
O mesmo acontece com a alegria. Dentro da alegria mais genuína, mais intensa, mora a sombra da tristeza. 
A tristeza só existe em função da alegria. É o medo de perder a felicidade que faz com que você se esforce para mantê-la.


Não há alegria inteira, nem tristeza pura, uma depende da outra. Podemos transpirar euforia, mas sobreviverá uma pontinha de melancolia lá no fundo de nosso riso. Porque mantemos a consciência de que a alegria, por mais duradoura que seja, vai passar. Que ela logo se transformará em nostalgia, e que não estaremos mais plenos como daquele jeito de novo – e isso não é ruim e nem é bom, é inevitável da experiência. 
A tristeza dentro da alegria nos permite pensar e entender o quanto aquele momento é importante e que precisamos aproveitá-lo enquanto dura.

A alegria é esta vontade de ser para sempre que termina. A tristeza vem nos consolar a aceitar que o fim de uma lembrança não significa o fim de nossa vida. De igual forma, dentro da tristeza mais severa, da depressão mais aguda, é possível notar a presença de uma alegria discreta, retraída, tímida.


Tudo pode soar péssimo, mas um abraço, um quindim, um filme, o telefonema insistente de um amigo é capaz de nos devolver a vontade de dar a volta por cima. 

A simplicidade é terapêutica, a banalidade nos cura dos grandes males da solidão. 
Haverá sempre o sol por detrás das nuvens escuras dos pensamentos suicidas. Na sombra mais espessa de nosso temperamento, coexistem os raios solares minúsculos do contentamento, das dádivas da rotina e dos pequenos prazeres.
Estaremos desolados com o tempo fechado e chuvoso do rosto, não enxergando nenhuma saída, mas a alegria se conservará perto e nos mostrará que a tristeza também passará, que é uma fase e um ciclo para absorver separações, desentendimentos e traumas. 

A lágrima brilhará como uma vidraça limpa e iluminada. Se a tristeza é saudade dentro da alegria, a alegria é esperança dentro da tristeza.

Nenhum sentimento é definitivo e completo. A luz veste a sombra, a sombra veste a luz. A alegria costura a tristeza, a tristeza costura a alegria. Alfaiates que se revezam no longo pano dos dias.

Fabrício Carpinejar

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