segunda-feira, 26 de maio de 2014

Presente de mãe


Ela se lembra daquele dia à saída do hospital. A enfermeira trazendo-lhe um serzinho enrolado como um charuto no fofo cobertorzinho com vira-manta bordada: “Toma, agora é você quem cuida! Boa sorte!”.

A moça, inocente de vida, nada para oferecer, pegou nos braços o recém-nascido. Sentiu-se flutuar! Não sabia se por felicidade genuína ou se por efeito do enorme senso de responsabilidade que a invadia, tudo acompanhado de descomunal sentimento de confusa impotência! Medo!!!

Tremeu! Apertou suavemente o bebê ao peito, contemplou–lhe o rostinho, as mãozinhas sempre próximas do queixo tentando escaparem-se do agasalho, como que já tateando o mundo... Sorriu-lhe. E ela, ao erguer a face para despedir-se da enfermeira, viu que de dentro de si erguia-se também outro ser. Era uma loba, uma tigresa, uma leoa?! A Mulher!

Ela dava à luz um filho, e o filho dava a ela todo o Universo!


Inerita Alcantara - Nossas Letras

O vazio existencial


Quem acordou um dia com um oco no peito, sentindo-se coisa e não gente?

- De repente, um enfaro, nada apaixona, nada faz mover um fio de cabelo?

- No raio de um instante, o desejo de sumir no mundo, repugnância pelo que vê, toca, ouve, fala; enjoo da própria rotina, vista, assim, sem sentido?

- Nauseado, a vomitar as vísceras vorazes de “mais e mais” sensações que, no andamento, lhe parecem bestas, inúteis, vãs?

- No triz de uma madrugada, pergunta-se: o que faz, fez, fará aqui, agora, com o que escolheu, batalhou, alcançou em parte, ou...?

- No átimo de um milionésimo segundo, se vê em um carnaval fora de hora, todos lhe parecem emborrachados de felicidades compradas ou falseadas. Para, abismado, olhos vítreos, se sente um ET, alienígena da grotesca coreografia de “família Doriana”, de “adolescência eterna”, de “politicamente correto”, etc. e tal?

Quem não?

Sensações passageiras, que nomeamos como tédio, desesperança, desespero, angústia. Realista para uns, pessimista para outros, alguns nomeiam “isso” de lucidez. Lucidez estranha, um facho de escuridão como disse Freud, para enxergar o que não emerge quando sob holofote.

Falta de sentido, falta de significado do vivido no passado e do que se vive no presente, mas também para o por vir, subjuntiva e futura mente: um vácuo, um oco, o vazio, o nada.

Alguns veem a incompletude e a vizinhança da morte. Outros descrevem o cavo do “nada”, sem possível preenchimento. Certezas em ruínas: uma Pompeia interior.

Outros ainda, aterrados, sentem-se fantasmas deambulantes do que pensam ser, não sentem que têm uma existência real, substantiva, na base do “eu sou”, ou melhor, do “eu é”. O eu existe para o outro, para o mundo? Apagar o passado e o futuro é Pompeia, sem o museu a declarar que existiu Pompeia.

Preencher esse vazio com coisas concretas ou com projetos (vá lá, uma abstração) é desviar da capacidade de se sentir já, aqui. É preciso não ser analfabeto emocional, ou não ser alfabetizado funcionalmente apenas nas emoções. Se não conseguir relacionar emoção/situação/experiência, não terá consciência do diagnóstico, do tal vazio existencial.

Se esse raio cai muitas vezes no mesmo lugar, atenção, está na hora de sintonizar consigo mesmo.

A oficina está do lado de dentro de você.

Maria Luiza Salomão - Nossa Letras

terça-feira, 20 de maio de 2014

Os Estatutos do Homem

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)


Artigo I
Fica decretado que agora vale a verdade.
agora vale a vida,
e de mãos dadas,
marcharemos todos pela vida verdadeira.

Artigo II
Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.

Artigo III
Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.

Artigo IV
Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
duvidar do homem.

Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.

Parágrafo único:
O homem, confiará no homem
como um menino confia em outro menino.

Artigo V
Fica decretado que os homens
estão livres do jugo da mentira.
Nunca mais será preciso usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de palavras.

O homem se sentará à mesa
com seu olhar limpo
porque a verdade passará a ser servida
antes da sobremesa.

Artigo VI
Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.

Artigo VII
Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridade,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.

Artigo VIII
Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a quem se ama
e saber que é a água
que dá à planta o milagre da flor.

Artigo IX
Fica permitido que o pão de cada dia
tenha no homem o sinal de seu suor.

Mas que sobretudo tenha
sempre o quente sabor da ternura.

Artigo X
Fica permitido a qualquer pessoa,
qualquer hora da vida,
uso do traje branco.

Artigo XI
Fica decretado, por definição,
que o homem é um animal que ama
e que por isso é belo,
muito mais belo que a estrela da manhã.

Artigo XII
Decreta-se que nada será obrigado
nem proibido,
tudo será permitido,
inclusive brincar com os rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia na lapela.

Parágrafo único:
Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.

Artigo XIII
Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.

Expulso do grande baú do medo,
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar
e a festa do dia que chegou.

Artigo Final.
Fica proibido o uso da palavra liberdade,
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre

o coração do homem.

Santiago do Chile, abril de 1964

Thiago de Mello nasceu na cidade de Barreirinha, no coração do Amazonas, no dia 30 de março de 1926. Em Manaus, capital do Estado, fez seus primeiros estudos. No Rio de Janeiro, cursou a Faculdade de Medicina até o quarto ano, mas acabou optando por deixar os estudos médicos e dedicar-se à poesia. Ficou conhecido internacionalmente por sua luta em prol dos direitos humanos, pela ecologia e pela paz mundial, o autor foi perseguido pela ditadura militar implantada no Brasil em 1964. Foi obrigado a deixar o nosso país, tendo se exilado no Chile onde produziu grande parte de sua obra.

do blog Educar faz a diferença

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Capacidade de amar


Uma das características da infância é a incapacidade de dividir coisas. Uma criança não pode dividir porque não se possui, porque ainda não sabe o que ela é. Você começa a identificar a maturidade a partir do momento em que uma criança consegue perceber as regras de um joguinho.

A maturidade faz parte de um processo. Em um processo não podemos queimar etapas. Ele é lento, chato e demorado.

Não nascemos amando, pelo contrário, queremos ter a posse dos outros. Essa é a forma de amar da criança, pois ela não consegue pensar de maneira diferente. Ela não consegue entender que o outro não é ela. Quantas pessoas, já adultas, ainda pensam assim, trata-se da incapacidade de amar devido à falta de maturidade.

Na maturidade de Jesus você encontra a capacidade imensa de amar o outro como ele é. 
Amar significa amar o outro como ele é. Por isso quando falamos em amar os outros podemos perceber o quanto deixamos de ser crianças. Devemos nos questionar a todo o momento com relação à nossa maturidade.

Pessoas imaturas sofrem dobrado. Pessoas imaturas querem modificar os fatos; ao passo que pessoas maduras deixam que os fatos as modifiquem. 
A maturidade nos faz perceber que não podemos mudar os fatos. Um imaturo ganha um limão e o chupa fazendo careta. O maduro faz uma limonada com o limão que ganhou.

Muitas vezes, os nossos relacionamentos de amizade são uns fracassos porque somos imaturos. 
Amigos não são o que imaginamos, mas o que eles são e com todos os defeitos. Amizade é processo de maturidade que nos leva ao verdadeiro encontro com as pessoas que estão ao nosso lado. Elas têm todos os defeitos, mas fazem parte da nossa vida e não as trocamos por nada deste mundo. Isso porque temos alma de cristão e aquele que tem alma de cristão não tem medo dos defeitos dos outros, porque sabemos que esses defeitos não serão espelhos para nós; mas seremos instrumentos de Deus para que os superem.

Padre só pode ser padre a partir do momento em que é apaixonado pelos calvários da humanidade. 
Se você não consegue lidar com os limites dos outros, é porque você não consegue lidar com os seus limites. A rejeição é um processo de ver-se.

Toda vez que eu quero buscar no outro o que me falta, eu o torno um objeto. Eu posso até admirar no outro o que eu não tenho em mim, mas eu não tenho o direito de fazer dele uma representação daquilo que me falta. Isso não é amor, isso é coisa de criança!

O anonimato é um perigo para nós. É sempre bom que estejamos com pessoas que saibam quem somos nós e que decisões nós tomamos na vida. É sempre bom estarmos em um lugar que nos proteja.

Amar alguém é viver o exercício constante de não querer fazer do outro o que nós gostaríamos que ele fosse. A experiência de amar e ser amado é, acima de tudo, a experiência do respeito.

Como está a nossa capacidade de amar? 
Uma coisa é amar por necessidade e outra é amar por valor. Amar por necessidade é querer sempre que o outro seja o que você quer. Amar por valor é amar o outro como ele é quando ele não tem mais nada a oferecer, quando ele é um inútil e, por isso, você o ama tanto. Na hora em que forem embora as suas utilidades você saberá o quanto é amado.

Tudo vai ser perdido, só espero que você não se perca. Enquanto você não se perder de si mesmo você será amado, pois o que você é significa muito mais do que você faz.

O convite da vida cristã é este: que você possa ser mais do que você faz!

Pe. Fábio de Melo

quarta-feira, 14 de maio de 2014

A paciência tudo alcança


“Respira. Serás mãe por toda a vida. 
Ensine as coisas importantes. As de verdade. 
A pular poças de água, a observar os bichinhos, a dar beijos de borboleta e abraços bem fortes. 

Não se esqueça desses abraços e não os negue nunca. 
Pode ser que daqui a alguns anos, os abraços que você sinta falta, sejam aqueles que você não deu. 
Diga ao seu filho o quanto você o ama, sempre que pensar nisso. 
Deixe ele imaginar. Imagine com ele. 

As paredes podem ser pintadas de novo, as coisas quebram e são substituídas. 
Os gritos da mãe ficam. Muitas vezes você pode lavar os pratos mais tarde. 
Enquanto você limpa, ele cresce. Ele não precisa de tantos brinquedos. 

Trabalhe menos e ame mais. 

Menos presente e mais presença! E, acima de tudo, respira. 

Serás mãe por toda a vida. Ele será criança só uma vez.” 

(Autor desconhecido)

Li esta mensagem no facebook e gostaria de partilhar com vocês e de destacar o que mais me tocou.


Não devemos perder as oportunidades incríveis nesta fase de infância de nossos filhos. 
Às vezes nos distraímos demais com coisas não importantes! 

Para o autor desconhecido, importante é fazer coisas junto de nossos filhos, brincando, apreciando os momentos, vivendo com atenção às belezas de nossa volta. Já repararam como as criancinhas são acometidas de surpresa e exaltação diante do belo, ainda que este belo seja uma simples formiguinha carregando uma folha? 
Simplicidade diante da vida nos faz mais parecidos com esses pequeninos, que olham o mundo de um jeito todo especial. 
Também é muito importante ensinar a abraçar, a demonstrar afetos, a valorizar o sentimento que sentimos uns pelos outros. E mais, para quem é cristão, ensinar a amar é um mandamento! Também o amor precisa de “exercício” – abraços, beijos que revelem o que a alma sente. 
Se não ensinamos nossos filhos a expressarem e a receberem amor, quem é que vai ensinar?!

“As paredes podem ser pintadas de novo, as coisas quebram e são substituídas. Os gritos da mãe ficam.” 
É claro que queremos uma casa arrumada, limpa, com enfeites etc. Mas isso não pode virar escravidão! 

O fato de haver criança em uma casa significa sujeira, bagunça e vasos quebrados de vez em quando… 

“A paciência tudo alcança” – dizia St. Teresa de Ávila – nos ensinando que, com paciência, tudo vai sendo construído e reconstruído. 
Como mães, precisamos de muita paciência! 

Lembro-me de um padre me aconselhando neste sentido. Na época, ele me perguntou quantos anos tinham meus filhos, para, em seguida, dizer: “você vai precisar de muita paciência…” 

Ah, os nossos gritos… como ressoam nos ouvidos indefesos dos pequenos. 
É preciso autocontrole que vem da virtude da paciência. E, com paciência, tudo caminha melhor. 

“Respira. Serás mãe por toda a vida.” De fato, respirar ajuda – e muito – a ter paciência. 
É engraçado que precisamos ser lembradas de que temos que respirar (parece absurdo já que respiramos involuntariamente para sobreviver…). 
É que “respirar” aqui tem um sentido: enquanto inspiramos devagar e, em seguida, conscientemente expiramos devagar, nosso coração se lembra do que é relevante nesta vida e de que não vale a pena estressar-se por coisas pequenas e passageiras.

Que riqueza tão grande são nossos filhos! 
Que oportunidade de crescimento e amadurecimento temos pelo fato de sermos mães – afinal é também por isso que os filhos estão aí, não? 

Aprendamos, pois, a curtir a infância, não deixando que o tempo passe rápido demais a ponto de não apreciarmos os encantos desta fase…

Santa Teresa d’Ávila, rogai por nós!

Cristiane
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sábado, 10 de maio de 2014

A canção de qualquer mãe

Filhos!

Que nossa vida, meus filhos, tecida de encontros e desencontros, como a de todo mundo, tenha por baixo um rio de águas generosas, um entendimento acima das palavras e um afeto além dos gestos – algo que só pode nascer entre nós.

Que quando eu me aproxime, meu filho, você não se encolha nem um milímetro com medo de voltar a ser menino, você que já é um homem.

Que quando eu a olhe, minha filha, você não se sinta criticada ou avaliada, mas simplesmente adorada, como desde o primeiro instante.

Que, quando se lembrarem de sua infância, não recordem os dias difíceis (vocês nem sabiam), o trabalho cansativo, a saúde não tão boa, o casamento numa pequena ou grande crise, os nervos à flor da pele – aqueles dias em que, até hoje arrependida, dei um tapa que ainda agora dói em mim, ou disse uma palavra injusta.

Lembrem-se dos deliciosos momentos em família, das risadas, das histórias na hora de dormir, do bolo que embatumou, mas que vocês, pequenos, comeram dizendo que estava maravilhoso.

Que pensando em sua adolescência não recordem minhas distrações, minhas imperfeições e impropriedades, mas as caminhadas pela praia, o sorvete na esquina, a lição de casa na mesa de jantar, a sensação de aconchego, sentados na sala cada um com sua ocupação.

Que quando precisarem de mim, meus filhos, vocês nunca hesitem em chamar: mãe!

Seja para prender um botão de camisa, ficar com uma criança, segurar a mão, tentar fazer baixar a febre, socorrer com qualquer tipo de recurso, ou apenas escutar alguma queixa ou preocupação.

Não é preciso constrangerem-se de ser filhos querendo mãe, só porque vocês também já estão grisalhos, ou com filhos crescidos, com suas alegrias e dores, como eu tenho e tive as minhas.

Que, independendo da hora e do lugar, a gente se sinta bem pensando no outro. Que essa consciência faça expandir-se a vida e o coração, na certeza de que aquela pessoa, seja onde for, vai saber entender; o que não entender vai absorver; e o que não absorver vai enfeitar e tornar bom.

Que quando nos afastarmos isso seja sem dilaceramento, ainda que com passageira tristeza, porque todos devem seguir seu caminho, mesmo que isso signifique alguma distância: e que todo reencontro seja de grandes abraços e boas risadas. Esse é um tipo de amor que independe de presença e tempo.

Que quando estivermos juntos vocês encarem com algum bom humor e muita naturalidade se houver raízes grisalhas no meu cabelo, se eu começar a repetir histórias, e se tantas vezes só de olhar para vocês meus olhos se encherem de lágrimas: serão apenas de alegria porque vocês estão aí.

Que quando pareço mais cansada vocês não tenham receio de que eu precise de mais ajuda do que vocês podem me dar: provavelmente não precisarei de mais apoio do que do seu carinho, da sua atenção natural e jamais forçada. E, se precisar de mais que isso, não se culpem se por vezes for difícil, ou trabalhoso ou tedioso, se lhes causar susto ou dor: as coisas são assim.

Que, se um dia eu começar a me confundir, esse eventual efeito de um longo tempo de vida não os assuste: tentem entrar no meu novo mundo, sem drama nem culpa, mesmo quando se impacientarem.

Toda a transformação do nascimento à morte é um dom da natureza, e uma forma de crescimento.

Que em qualquer momento, meus filhos, sendo eu qualquer mãe, de qualquer raça, credo, idade ou instrução, vocês possam perceber em mim, ainda que numa cintilação breve, a inapagável sensação de quando vocês foram colocados pela primeira vez nos meus braços: misto de susto, plenitude e ternura, maior e mais importante do que todas as glórias da arte e da ciência, mais sério do que as tentativas dos filósofos de explicar os enigmas da existência.

A sensação que vinha do seu cheiro, da sua pele, de seu rostinho, e da consciência de que ali havia, a partir de mim e desse amor, uma nova pessoa, com seu destino e sua vida, nesta bela e complicada terra.

E assim sendo, meus filhos, vocês terão sempre me dado muito mais do que esperei ou mereci ou imaginei ter.

Lya Luft


Dia das Mães


Uma das melhores definições de coração de mãe está na Bíblia.
Antecipando o espírito natalino para o Dia das Mães, há que respirar um ar de mistério. Deixando-se embalar pela música. Envolvendo-se no ambiente de despojamento em que Jesus nasceu em Belém.

Pobreza e mistério soam como sinônimos: difícil admitir a pobreza, impossível desvendar o mistério. Em meio a todas essas coisas que estavam acontecendo, Maria as absorvia e as guardava em seu coração.
Guardar no coração significa agasalhar sentimentos purificando-os, como que num cantinho, num cadinho em que se realiza a fusão dos ingredientes instintivos e inexplicáveis da vida humana.

Gerar, gestar, dar à luz. Carne de sua carne, vida de sua vida...
Essa experiência começa no seio materno:
escola particular, com aulas particulares, durante nove meses.
Esse, um título superior a qualquer diploma, a qualquer medalha.

Ali, no recôndito, inicia-se o mistério: gerar conscientemente uma vida humana. Escondidinho, ali está o feto, que só se revela à medida que a gravidez se desenvolve. Ali, no seio materno, se engendra o filho, engendra-se a filha, futura mãe em potencial.

Ser mãe não é produzir em série, descaracterizando a obra da criação.
Ser mãe é participar do mistério da criação.
Ser mãe é escrever um livro da vida que jamais se repete.

Depois que a criança nasce, grande expectativa é que ela própria reconheça sua mãe ao pronunciar, pela primeira vez, a palavra mamãe. 
Uma palavra genérica, que vale para todas as mães, porém, ao mesmo tempo, inconfundível. 
Mãe é uma só. Única. Por isso, mesmo quando nem tudo são flores, é aos braços maternos que recorrem os adultos. 
Braços que se dobram sobre o colo. Tomar ao colo, como se faz com uma criancinha, continua significando, para os adultos, toda a proteção, todo o carinho, todo o amparo que lhes advém pelo fio condutor que aponta para o colo do útero.

Ah! Por falar nisso, hoje é Dia das Mães. Então, um feliz Dias das Mães!

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Mães e mulheres


Se a mulher parar e analisar o que será sua vida depois de mãe, ela não vai querer ter filhos. A sobrevida maternal é desfiar de insanidades. 
Nunca mais, por exemplo, dormir noite inteira, muito menos cumprir o ritual de filme americano: escovar dentes, pentear cabelos, pôr linda camisola, deitar-se languidamente, acender o abajur, ler sem interrupção sobre almofadas macias, desligar o abajur, virar-se para o canto, apagar e só acordar na manhã seguinte quando o olho abrir sozinho. 
Uma noite inteira, depois? Nem sob o efeito de poderoso soporífero, daqueles derruba leão, desculpe, leoa. (A mulher não pensa nisso, quando decide se tornar mãe.)

Suspeita nunca confirmada: desconfio que, no momento do parto, nasce-nos poderosa mola invisível. 
O filho geme no quarto ao lado e nos surpreendemos: sem saber como, acordamos em pé ao lado do berço ou da cama - tenha o filho a idade que tiver. 
A mãe sente quando ele ficará doente, a despeito da febre ou da dor ainda não manifestas. 
Ela sabe, percebe, lê nas entrelinhas quando a mentira permeia ou embasa o discurso dele. 
Ela se contorce pela dor do filho seja quando ele arranca dente, toma soco, sofre injustiças ou perde um amor. 
Ela compartilha, mensura a dor do filho pela sua própria, de mãe. 
Mãe tem sexto sentido. Tem poder adivinhadeiro. (A mulher sofre metamorfoses internas e externas para virar mãe.)

Elas trabalham em pé o tempo inteiro, não têm férias, salários, descanso remunerado e estão em atividade segundo após segundo, ano após ano. 
A única promoção que ganham é a mudança de status acompanhada do dobro de trabalho e preocupação, quando passam de mãe para avó. 
No entanto creem-se recompensadas ao receber olhar, abraço, beijo, bilhete, flor, cartão dos filhos ou dos filhos destes. (A mulher é profissional, a mãe é só poesia.)

Filhos, ao nascer, poderão fazer a mãe se angustiar e, quem sabe, se frustrar - mesmo com pré-natal supervisionado por tecnologia e profissionais dedicados. 
Algo pode dar errado com relação ao bebê. É angustiante produzir algo, pedacinho por pedacinho, sem idéia do resultado, além de que, podem ser decepcionantes coisas mínimas: onde ela sonhava placidez, dão-lhe o aflito bebê; no lugar do loirinho de olhos azuis, apresentam-lhe o moreno de olhos de jabuticaba; não a menina delicada, mas o menino agitado e inquieto. 
Fica-se permanentemente sob a espada. Podem surgir grandes complicações: a doença insidiosa e irrecuperável, a exigência de cuidados constantes. 
Bem, se a desesperança frustra, os filhos entram em suas vidas como avassaladores tsunamis, e elas conseguem coragem e disposição, reorganizam o caos e oferecem inimagináveis exemplos de formas de amar. (Mulheres são previsíveis, mães surpreendentes.)

Gerar e parir um ser não conferem santidade a nenhuma mulher. 
A tarefa executada diária e diuturnamente de transformar o ser bruto que recebeu em ser humano, esta sim torna a maternidade santificadora. Mães, por serem pessoas, às vezes se tornam feras. 
No oposto da criatura que parece idealizada e moldada segundo estereótipo de perfeição, há mulheres que relegam os filhos, que não se importam com eles, que são egoístas, vivem encapsuladas, se mostram incapazes de amar. (Algumas são apenas mulheres que pariram; aquelas outras são mães.)

Há pais maravilhosos que compartilham e participam da vida do filho. 
Pudesse, eu os premiaria: sentir o primeiro movimento do filho no útero; perder o ar quando ele se empelotar e deformar a barriga, mais o primeiro sorriso consciente do bebê. 
Torceria para que, um dia, recebessem desenhado no papel de embrulhar pão, o rabisco de estranho alienígena de corpo redondo e pernas finas, dois riscos no lugar do cabelo, coração enorme circundando tudo e três palavras: eu amo você. 
Para mães, o mínimo é sempre mais.

Lúcia Helena Maníglia Brigagão -Jornal Comércio da Franca

terça-feira, 6 de maio de 2014

A caixinha



Certa vez, um granjeiro, incomodado com a baixa produtividade de sua granja resolveu procurar um sábio, para que o ajudasse com seu problema.
Chegando à moradia do sábio, contou seu problema. O sábio, então, escreveu algo em um pedaço de papel e colocou em uma pequena caixa. Depois a fechou e a lacrou com cera quente. Feito isto, entregou a caixinha ao granjeiro, dizendo:
- Leve esta caixa por todos os lados de sua granja, três vezes ao dia, durante um ano, mas nunca a abra.

Na manhã seguinte, ao ir ao campo segurando a caixa, encontrou um empregado da limpeza dormindo quando deveria estar trabalhando. Acordou-o e chamou sua atenção. Mais à frente, dois empregados jogavam baralho, e também levaram um puxão de orelha.
À tarde, quando foi aos criadouros, encontrou os frangos sem ração suficiente.
À noite, indo à cozinha, deu-se conta de que o cozinheiro estava desperdiçando os gêneros.
A partir daí, todos os dias, ao percorrer sua granja, de um lado para outro, carregando a caixinha, ele encontrava coisas que precisavam ser corrigidas.

Ao final do ano, voltou a encontrar o sábio e lhe disse:
- Deixe esta caixa comigo por mais um ano? Minha granja melhorou o rendimento desde que estou com esse amuleto.
O sábio riu e, abrindo a caixa, disse:
- Podes ter este amuleto pelo resto de sua vida.

No papel havia escrito a seguinte frase:

“SE QUERES QUE AS COISAS MELHOREM, DEVES ACOMPANHÁ-LAS CONSTANTEMENTE”.

Compartilhei esta conhecida história para refletirmos sobre a importância da constância e do comprometimento...

Carlos Hilsdorf
PÁGINA OFICIAL: Carlos Hilsdorf

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Mãe


“Mãe é tudo igual” é a máxima que, vira e mexe, aparece nas conversas, quando, frequentemente falamos delas. Eu sempre preferi a outra frase não menos clichê: “mãe é mãe”. Assim, sem negociação. Mãe é mãe. E isso é a mais pura e óbvia verdade. Elas não são todas iguais, apesar de compartilharem desse amor só comum a elas.
Mães são diferentes. 
Existe aquela que é “melhor amiga da filha”, outra se mantém a vida toda mais reservada, no lugar de mãe. Mães boas de cuidar de criança, outras melhores quando os filhos são adultos. 
Mãe não é tudo igual e sabemos: não tem certo ou errado. 
Mãe é mãe. E quando a coisa aperta, não tem jeito, tem situações que só mãe resolve. Não há amiga, namorado, pai, irmão, padre ou guru que tenha as palavras dela.

Cada mãe tem a sua sabedoria. Cabe a nós, filhas, saber desfrutá-la da melhor maneira. Porque mãe é mãe, na hora que ela percebe detalhes que a gente deixa passar. Desde esquecer o pijama para levar na viagem do colégio, até o sexto sentido para te avisar que uma certa amiga, bem, não é sua amiga de verdade e que vai passar a perna em você. 
Mãe é mãe quando percebe nossas loucuras, os exageros, os dramas. Uma menina fazendo birrinha. Lembro de ver minha mãe e minha avó passeando juntas e achar engraçado ela fazer coisas que só filha faz com mãe. 
Pedir cuidado ao mesmo tempo que cuida. Talvez essa seja uma das trocas mais especiais entre mãe e filha. Essa cumplicidade que só vai se repetir quando nós formos mães.

Mãe é mãe nos pequenos cuidados. Compra um docinho para você na tpm, te chama para assistir um filminho na TV, quando você está doente e chatinha, dá uma ajuda quando você está dura no fim do mês. 
E mãe é mãe também nos mimos: quando acha que você tem razão em todas as suas brigas com outras pessoas – que não ela, é claro – quando diz que você está linda mesmo você se sentindo um lixo. 
Mãe é mãe e liga. Sim, ela telefona em várias horas erradas: às vezes, no meio da sua reunião de trabalho, ou na academia. 
Ela liga para saber do tempo da praia, para papear, fofocar do vizinho da frente, saber se você está bem, se já fez as pazes com seu irmão, se está precisando de lençóis novos. 
E mãe é mãe nas duras, como deveria ser. Na hora que tem que te ensinar a ser forte, a ser mulher, a correr atrás do seu. Ela dá chacoalhão quando você está dramatizando seus problemas, manda aquele “eu te avisei” em situações que você não ouviu ela, enche o saco, critica algumas escolhas. E já sabemos: muito provavelmente ficaremos iguaizinhas a elas. 
Quem nunca se viu repetindo uma atitude da mãe que se prometeu que jamais faria ? Mãe é amor.

Então, mãe não é tudo igual, mas mãe é mãe e, se eu pudesse, faria como o sábio poeta Drummond que disse: “Fosse eu Rei do Mundo/ baixava uma lei: Mãe não morre nunca/ mãe ficará sempre junto do seu filho/ e ele, velho, embora/ será pequenino/ feito grão de milho”.


Marilia Neustein - http://blogs.estadao.com.br/